Postagem em destaque

1964: O Brasil Entre Armas e Livros (2019)

Documentário revisionista que busca impor uma narrativa histórica própria que deslegitime a vasta bibliografia sobre o tema, consid...

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

Nebraska - 2013

Um dos nove filmes concorrentes ao Oscar de Melhor Filme, "Nebraska" nos apresenta  história do mecânico aposentado, Woodrow "Woody" T. Grant (interpretado brilhantemente por Bruce Dern), que acredita ter sido sorteado com um prêmio de um milhão de doláres. Para tanto, precisa retirar o dinheiro pessoalmente na cidade de Linconl, Nebraska. Logo de início, o filme nos deixa claro que essa história não passa de uma fantasia de Woody, pois o "prêmio" que ele tanto acredita ter ganho não passa de merchandising barato de uma editora de revistas.




Aposentando e com um histórico de abusos de álcool, Woody é tratado por sua mulher, Kate Grant (June Squibb) e seus dois filhos, Ross (Bob Odenkirk) e David (Will Forte) como um estorvo, sendo um exemplo de mau marido e de péssimo pai. Depois que ele começa com a história do prêmio, o coro dentro de casa é que se envie ele para um asilo, apenas o seu filho mais novo, David, resiste a ideia de ver seu pai em um local como este. Apesar de toda a descrença de sua família, o personagem principal não desiste do seu "prêmio" e já que sua família, a princípio, não concorda em levá-lo e como ele não pode dirigir os 1100km que separam a cidade de Billings, em Montana, onde mora, até Linconl, Nebraska, onde supostamente receberia seu milhão, pois não tinha licença para dirigir, Woody tentará de toda sorte para chegar ao seu destino. Depois de algumas tentativas, David decide ir com o pai até Nebraska. Não por quê acredita na história do pai, mas sim por quê viu que seria a única maneira de fazer o pai entender que não haveria prêmio nenhum.

Como todo road movie o filme faz uma paralelo com o ato de se deslocar de um ponto ao outro na geografia real, para desenvolver também os personagens, levá-los de um postura à outra dentro do filme. Se no inicio vemos uma família que tende a tratar Woody com um certo desprezo, ao longo do filme e dos fatos que se desenrolam cada personagem vai mostrando sua verdadeira face e sua afeição ao patriarca. A importância do ato de deslocar-se fica claro com o intinerário da viagem e onde se desenrola os fatos do filme. No início da trama, temos a cidade de Billings como nosso ponto de partida, onde somos apresentado a trama inicial, e também, logo de cara somos apresentado ao nosso ponto de chegada, o estado de Nebraska, onde Woody espera receber seu milhão, porém toda a trama se desenvolve na cidade de Hawthorne, cidade-natal do nosso personagem principal. Depois de uma noite de bebedeira, Woody cai e consegue um corte feio na testa, impedidos de continuar a viagem até que ele se recupere, o filho leva o pai até sua cidade-natal para visitar os seus tios, velhos amigos e também onde sua mãe e seu irmão se juntariam a viagem. É nesse ponto que somos apresentados ao verdadeiro sentido do filme.



Logo sabemos que Woody foi uma espécie de pária na cidade, um bêbado fracassado, nada diferente da idéia de que se tinha dentro do seu núcleo familiar. Porém, logo toda a cidade descobre, através da boca do própria Woody, que ele iria se tornar um milionário. Toda a cidadezinha fica encantada com a sorte dele. Todos festejam a sorte do "filho pródigo". Até o jornal local decide fazer uma reportagem sobre sua história. O que causa muito embaraço ao seu filho David, pois ele sabe que a história não passa de fantasia do seu velho pai. de boca em boca a história vai se espalhando, as pessoas o cumprimentam na rua, os irmãos que há muito tempo não via se reúnem para saber da novidade e quando questionado sobre o que iria fazer com o prêmio, ele sempre respondia "comprar uma nova caminhonete e um compressor de ar", ambições pequenas para um milionário. Não demora muito até que apareça aproveitadores reclamando uma fatia do dinheiro, sempre com a desculpa de que quando Woody estava em mais um de seus constantes problemas financeiros, ele tomou empréstimos que nunca pagou. O que causa uma situação constrangedora para família, pois não há dinheiro para ser ganho e mesmo assim as pessoas reivindicam uma fatia do prêmio.

É nesse ponto do filme que vemos a família de Woody se conectar com o patriarca da família. O filho mais velho, Ross, que tanto defendia a internação do pai, passa a defende-lo com unhas e dentes das garras gananciosas dos parentes. Sua mulher, também passa a defender Woody perante a família, apresentando verdades que fazem o espectador ver que o personagem principal nunca foi um aproveitador da família, pelo contrário, sempre ajudou os familiares sem querer algo em troca. Aliás, são nessas sequencias que se passam na cidade natal deles que temos as melhores cenas de June Squibb. Com seu olhar sempre angelical e sua voz meiga, ela apresenta os personagens da cidade aos filhos sempre de uma maneira cruel e depreciativa. É hilário ver aquela senhora de cabelos brancos, destilar tanto veneno sobre seus conterrâneos.




Porém, como fica claro no filme, é o filho David que vai de fato construir uma conexão forte com o pai. Ambos são em algum aspecto parecido. Se Woody chegou ao fim da vida como um velho bêbado aos olhos da família, David é um homem entre seus 30 anos que trabalha como vendedor de uma loja de aparelhos de som, mora em um pequeno apartamento e foi recentemente abandonado por sua namorada, o que é um contraponto ao irmão, âncora de um jornal local e com um casamento estável. Embarca nessa viagem para fugir dos seus próprios problemas, do seu dia-a-dia maçante e uma chance de se conectar com o pai, descobrindo novas experiências e novas conexões com seu velho pai, qualidades que nunca havia percebido naquela figura paterna




Além de uma boa história, o filme tem ainda pontos que gostaria de destacar. O primeiro é o modo como o diretor trata o dia-a-dia dos personagens, como algo maçante, chato, sem nenhuma novidade, onde a dor de um pé é a única novidade que o irmão de Woody tem para dizer a eles depois de anos sem se ver. As cenas de reuniam familiares são cenas de silêncio em sua maioria, onde todos estão com suas atenções voltadas para a televisão, ou conversando uma trivialidade e até mesmo sentando na beira da calçada, olhando apara rua esperando que alguma coisa extraordinária aconteça. Não é de se espantar portanto, que o grande evento desencadeador do filme seja uma simples carta com um propaganda de um pretenso prêmio a ser recebido. Qualquer desculpa seria suficiente na avidez de se quebrar um vida monótona, chata e monocromático. Acredito que a escolha da fotografia preto e branco seja justamente para passar essa impressão, de uma vida sem cores. Porém, é essa mesma fotografia sem cores que nos mostrará a beleza do dia-a-dia, mesmo que em tons de cinza. Aliás, deixo aqui minha torcida que o Oscar de Fotografia fique para o "Nebraska", não só por se tratar de uma fotografia P&B, mas sim pela qualidade dela. Os planos abertos, onde podemos ver as estradas e o céu são de uma beleza formidável.




Para encerrar, digo que "Nebraska" é um excelente filme, com uma história cativante onde os atores nos entregam atuações primorosas. Acho difícil o Bruce Dern ganhar o Oscar, não por quê não mereça, mas sim por conta que o Matthew McConaughey está muito bem cotado com sua atuação em "Clube de Compras Dallas", porém torço para que a June Squibb leve esse prêmio, mesmo com a forte concorrência das atrizes Jenifer Lawrence (a mais nova queridinha de Holywood) e da Lupita Nyong'o e sua excelente interpretação em "12 anos de escravidão". Um filme que ao final nos mostra que as vezes para nos sentirmos de fato realizado na vida, não precisamos alcançar coisas grandes, mas sim coisas significativas.