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domingo, 16 de março de 2014

Lobo de Wall Street 2013


A ascensão e queda de Jordan Belfort, corretor de valores que ficara conhecido como Lobo por devorar altíssimos valores imobiliários e persuadir crescimentos estapafúrdios fora-da-lei engrupindo os mais diversos clientes. 


Fazia tempo que eu não via este Scorsese, mais em forma do que nunca, cara de pau, escroto, atirando a todos os lados lembrando-me a loucura crítica de John Carpenter em Fuga de Los Angeles - logicamente respeitando o estilo de ambos para esta citação/comparação, feita aqui por mim pelo radicalismo empregado por ambos em suas críticas ao establishment político do capital americano no American Way of Life.

Muitos lembraram de Os Bons companheiros (1990) e Cassino (1995) do próprio Scorsese neste LOBO, porém tenho uma teoria simples e clara acerca disso... Para esfaquear o capitalismo, entre seus pormenores idiossincráticos nas bolsas de valores a decupagem geral fornecida por Scorsese fora similar a mesma utilizada no fazer de seus filmes de gangsters por assim dizer, como se o diretor tratasse os corretores como uma rede mafiosa assim como tratara nos filmes anteriormente citados. Isso fica bem claro, a meu ver, pela estrutura crescimento/ascensão total/queda/julgamento/ressaca imposta no LOBO que está presente em Os Bons Companheiros e Cassino. Isso já beira uma piada metalinguística intrínseca na própria filmografia dele. Outro ponto em comum é diversidade narrativa no personagem de Belfort onde a quebra da quarta parede serve como maior força narrativa sempre com mordacidade e cinismo (o que acontecia em Os Bons Companheiros com Ray Liotta, porém de maneira mais comedida). Porém aqui ele atinge níveis superiormente radicais, onde a corrupção perambula em tudo, e tudo é comprável (ou quase tudo, onde a desilusão do agente do FBI voltando de metrô pra casa e praticando trabalho honesto é genial). 

A ideia aqui é o avacalho total, por vezes exagerado demais (entretanto um exagero de uma realidade possível sim), mas o filme busca o exagero a farra, a pura esculhambação... A martelada infame e escrota da cabeça do espectador. Manda um recado ao capitalismo selvagem, que nem seria arranhado por um filme assim, lógico caramba, o mesmo com estruturas já há muito fomentadas somente um filme não deceparia sua cabeça. Porém genialmente sem tomar partido de forma clara. Por vezes ficamos absortos com o estilo de vida extravagante de Belfort e quase queremos o seu poder. Aqui está a inteligência de Scorsese onde mostra-nos como uma vida como esta é chamativa e atraente, levando tudo na putaria, da corrupção, nos usos mais estapafúrdios de drogas ainda mais estapafúrdias (a repetição da palavra se tornou necessária para a compreensão da loucura assustadora que é empregada por Scorsese, repetição eterna de uma esculhambação insana em cima da outra).

Roteiro excelente que consegue manter um texto detalhadíssimo e divertido, nunca tendo uma queda pelas diferentes mudanças dentro do longa. Uma densa e áspera narrativa das mais diversas insanidades muito bem descritas, aproveitando-se do melhor do que fora mais catártico e ácido na biografia de Belfort. Sempre buscando mostrá-lo como humano e traiçoeiro, disposto a tudo nem que seja por uma mísera cheirada de pó.

A personificação de DiCaprio é um primor, onde aqui o seu overaccting exagerado se encaixa de maneira sublime a proposta do longa, onde ele compõe a melhor atuação de sua vida, desde a suposta seriedade com seus clientes às suas viagens no mundo das drogas com direito a baba na boca, paralisia cerebral e ressuscitamento com cocaína ao som da trilha sonora do espinafre do Popeye, rasgado e com muito humor. Isto porto pra não me ater demais, mas lembrar do ótimo trabalho do resto do elenco onde Matthew McConaughey e Jean Dujardin arrebentam. 

Como sempre, tecnicamente irrepreensível. Com uma edição, como não poderia deixar de ser diante de sua proposta, frenética e recortada, multiplicando a confusão visual e, não-paradoxalmente, deixando clara sua intenção de exposição daquele multifacetado universo. Fotografia colorida e delirante que diverte visualisando muito bem desde sexualidade excessiva e uso abusivo de drogas aos aspectos vis e detalhados de uma bolsas de valores. Trilha sonora, novamente, excelente onde aqui confirmamos a certeza de que apenas um punhado de diretores americanos sabem usar músicas não originais e encaixá-las em seus filmes como Scorsese consegue. 

A demonstração do desapego a qualquer questão ética e moral é bastante clara e Scorsese aponta isso desde o início. São exatamente estas execráveis criatura que comandam grande parte da economia americana. Que através de especulação absurda por cima de especulação absurda crises financeiras, como a de 2008, vieram a ocorrer. E as consequências por sobre muitos destes criminosos fora qual? Prisão para alguns? Sim. Porém a manutenção de sua riqueza ou novas oportunidades na mesma área, em muitos casos, era tida como certa. Tudo da certo numa boa, o sistema governamental americano acabaria por bancar as despesas tirando verbas de outros pontos estratégicos (não o bélico eu creio) para suprir a bolha deixada pelas grandes especulações. Manutenção da esculhambação. É um bom mote.

Um filme corajoso de um cara que não tem mais nada a provar pra ninguém e manda um belo dane-se a muitos de seus detratores e outros tantos grupos político-econômicos e pratica uma das melhores obras de sua amplamente respeitável carreira. Onde expõe que mesmo um escroto que se entupiu de dinheiro, fama, drogas e todas as putarias proibidas possíveis tem seu direito (senão um dever) a um recomeço na terra das oportunidades.

Nota 9,5

Por Ted Rafael Araujo Nogueira